segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Subnotificar acidentes é sonegação fiscal

Por Luís Alberto Ferreira

     O Ministério da Previdência alterou, no ano passado, a metodologia de cálculo do Fator Acidentário de Prevenção (FAP) para cobrar das empresas o crescente custo com o pagamento do auxílio-doença e benefícios por morte e invalidez. As empresas que tivessem aumentados seus índices de frequência, gravidade e custo dos acidentes de trabalho seriam penalizadas com uma alíquota maior sobre sua folha de pagamentos ao INSS, relativamente ao Seguro Acidentário do Trabalho (SAT). O objetivo da norma era obrigar as empresas a aumentarem seus investimentos na prevenção de acidentes e doenças ocupacionais.
     Ocorre que tal mudança de metodologia vem se mostrando infrutífera. Há muitas empresas que têm por prática subnotificar acidentes de trabalho. Como teriam que pagar uma alíquota maior em caso de aumento da frequência e da gravidade dos acidentes, essas empresas passaram a tentar esconder ou desqualificar ainda mais os acidentes e doenças ocupacionais.
     Os sindicatos, como o Sindipetro Caxias, que vêm denunciando tal prática ao Ministério Público do Trabalho têm obtido importantes vitórias na justiça. No entanto, é preciso que o próprio INSS e também a Receita Federal, que fiscaliza o recolhimento previdenciário, se insiram nessa luta. A subnotificação de acidentes e a desqualificação das doenças profissionais constituem crime de sonegação fiscal, previsto no parágrafo 2º, inciso I, da Lei 8.137/90. É preciso autuar e multar as empresas, cobrar a majoração da alíquota do SAT e responsabilizar os agentes.
     Por outro lado, subnotificar acidentes e esconder doenças acarretam enorme prejuízo ao trabalhador, pois mascaram a necessidade de investimentos em segurança e saúde. E é o trabalhador que, na ponta da linha, está exposto aos riscos do ambiente de trabalho.
     Resta à classe trabalhadora estar atenta e denunciar ao sindicato e à CIPA a desqualificação das doenças ocupacionais e a prática odiosa da subnotificação de acidentes por parte das empresas. Isso porque a saúde e a vida de cada trabalhador não têm preço. Valem muito mais que um percentual da folha de pagamentos.

     Artigo publicado no informativo Unidade Nacional nº 219, do Sindipetro Caxias, em 06 de janeiro de 2011.

Você vai ler no banheiro?

Por Normando Rodrigues*

     Boa parte da categoria petroleira que trabalhou ou trabalha em unidades gerenciadas por norte-americanos já vivenciou o autoritarismo típico daquela cultura, o qual chega às privadas. São diversos os incidentes provocados pelos “gringos”, ou por brasileiros que elegeram aquela insana sociedade como modelo, envolvendo o tempo que o trabalhador leva no banheiro.
     Em mais de um caso, chegaram a determinar que as portas dos reservados fossem retiradas, para expor quem os usava. Isso não é privilégio do Brasil. Petroleiros noruegueses contam que no início da exploração do Mar do Norte, na segunda metade dos anos de 1960, os norte-americanos eram a maioria dos gerentes, e que nessa época os “gringos” fizeram o mesmo por lá, pois os noruegueses costumam levar livros para as privadas.
     Aqui tais incidentes ainda são corriqueiros, infelizmente, agredindo a privacidade dos trabalhadores. Em julgamento no dia 30 de novembro de 2010 (AIRR 6740.31.2006.5.01.0027), uma empresa de telemarketing foi condenada pelo TST a reparar danos morais decorrentes de seu controle do tempo de uso dos banheiros, considerado vexatório e agressivo à dignidade pessoal dos trabalhadores.
     De volta aos noruegueses, ouvimos deles que aprenderam com os norte-americanos a não reproduzir seus erros no gerenciamento de pessoas e no processo de exploração e produção em alto mar. Disse-nos um dirigente sindical norueguês que os “gringos” alegavam um conhecimento técnico muito maior do que real ou, em suas próprias palavras, que “pareciam ter uma boca muito maior do que o cérebro”.

* Assessor jurídico do Sindipetro Caxias

Artigo publicado no informativo Unidade Nacional nº 219 do Sindipetro Caxias, em 06 de janeiro de 2011.

Natura demite trabalhadores doentes

     Funcionários dispensados estavam em tratamento médico por lesões adquiridas  na empresa

Por Michelle Amaral

     Durante 18 anos Adenilda Costa dos Santos trabalhou na linha de produção da empresa de cosméticos Natura. Há 12 anos está doente e passa por tratamento médico por conta de lesões decorrentes de sua atividade profissional. No dia 29 de novembro, a trabalhadora foi demitida sob alegação de falta de comprometimento com a empresa.
     Adenilda faz parte de um grupo de 33 trabalhadores demitidos das fábricas da Natura em Cajamar (SP). Destes, 22 possuem algum tipo de lesão adquirida durante o tempo em trabalharam na empresa.
     Os funcionários lesionados estavam em processo de reabilitação profissional. Grande parte desses operários estava com cirurgia programada e trabalhava em linhas de produção específicas, criadas para aqueles que estavam em recuperação. Após a demissão do grupo, uma das linhas foi desativada.

De acordo com as entidades dos trabalhadores, este não é um caso isolado na política da Natura.

     Segundo a advogada do Sindicato dos Químicos Unificados, Milene Simone, essa demissão é ilegal, porque “fere a garantia de tratamento durante o período em que o trabalhador estiver doente, que está assegurada na cláusula 17ª da Convenção Coletiva dos Trabalhadores Químicos e Plásticos”.
     Os 22 funcionários procuraram o sindicato e foram submetidos a exame clínico que comprovou que possuem Lesão por Esforços Repetitivos / Doenças Osteomusculares Relacionadas ao Trabalho (LER/DORT) e que necessitam de tratamento médico prolongado.
     As doenças ocupacionais são regulamentadas pela Lei 8.213 de julho de 1991, que, além do tratamento, garante a estabilidade profissional de 12 meses após a doença. Os trabalhadores da Natura ainda estão doentes, por isso, não poderiam ter sido demitidos, conforme explica a advogada trabalhista.
     De acordo com a entidade dos trabalhadores, esse não é um caso isolado na política da Natura com os funcionários que adoecem em suas linhas de produção. No entanto, Nilza Pereira de Almeida, da diretoria colegiada do sindicato, afirma que essa é a primeira vez que a empresa demite tantos funcionários de uma só vez.
     Nilza conta ainda que, desde 1995, o sindicato acompanha casos semelhantes, que já somam 98 funcionários doentes demitidos pela empresa.

Falta de comprometimento
     Em nota encaminhada ao Brasil de Fato, a Natura afirma que houve “o desligamento de 33 colaboradores de suas fábricas de Cajamar por falta de comprometimento”. A empresa cita que os trabalhadores utilizavam a reabilitação para “justificar comportamentos inadequados”.
     Roberta Silva de Oliveira, funcionária da Natura há quinze anos, diz que a falta de comprometimento alegada pela empresa no momento de sua demissão se deve, na verdade, às faltas constantes decorrentes do tratamento médico a que era submetida.
     “Disseram que eu estava sendo demitida por falta de comprometimento com a empresa. Eu faltava, mas sempre com atestado médico, atestado do ortopedista, porque eu fazia tratamento”, explica Roberta.

Uma comissão, formada por representantes do Sindicato dos Químicos Unificados e duas ex-funcionárias, esteve em Brasília (DF) no dia 15 de dezembro e entregou um dossiê de denúncias contra a empresa.

     A trabalhadora, que sofre de tendinite, bursite e hérnia de disco, conta que foi diagnosticada com LER em 1996 e, desde então, passa por acompanhamento médico. Durante esse período, Roberta foi afastada pelo Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) em quatro ocasiões.
     Já Adenilda Costa do Santos revela que na fábrica Rio da Prata – uma das três fábricas da Natura em Cajamar - da qual era funcionária, a própria empresa restringia a rotina de trabalho daqueles que possuíam algum tipo de lesão. A trabalhadora relata que, juntamente com outras três colegas em reabilitação, cumpria o período de trabalho diário em um espaço reservado na fábrica sem acesso a nenhuma atividade profissional. “Éramos obrigadas a cumprir o horário de trabalho e não davam serviço para nós devido às restrições médicas”, descreve.

Tratamento médico
     O médico do trabalho do Sindicato dos Químicos Unificados, Roberto Carlos Ruiz, que examinou os 22 trabalhadores demitidos, explica que a queda de produtividade no caso deles é justificada pelas dores que sentem por causa das lesões. “Não tem como manter o mesmo padrão [trabalho] com a lesão que eles têm, é uma consequência óbvia da inflamação o rendimento desses trabalhadores cair”, detalha.
     O médico chama a atenção para a necessidade do tratamento clínico para estes trabalhadores demitidos, em sua maioria mulheres com idades entre 35 e 44 anos. A demissão, entre outras coisas, significa a suspensão do convênio médico que lhes garantia a realização do tratamento.
     Para os funcionários que tinham cirurgias agendadas, a Natura afirma que está “cumprindo a legislação vigente e a convenção coletiva da categoria e estendeu o prazo de vigência do plano de saúde”.
     No entanto, o médico afirma que não basta garantir a realização da cirurgia, é necessário um acompanhamento. “O que eles necessitam é de assistência à saúde, que envolve não apenas o tratamento médico, mas a fisioterapia, eventualmente acupuntura, terapia ocupacional e acompanhamento psicológico”, defende doutor Ruiz. Ele acrescenta que, “a interrupção [do tratamento] pode piorar o quadro clínico desses trabalhadores”.

Reintegração
     De acordo com Nilza Pereira de Almeida, num primeiro momento, o sindicato encaminhou uma carta pedindo a reintegração dos funcionários, que foi negada pela empresa. A partir daí, foi iniciado um período de denúncia pública da situação vivida pelos trabalhadores da Natura. “Todos os órgãos legais que a gente puder acionar, a gente vai acionar”, relata a diretora do sindicato.
     Segundo a advogada trabalhista, Milene Simone, “a reintegração das funcionárias é possível se forem comprovados indícios que a Natura teve a intenção de se livrar desses trabalhadores doentes”.
     A advogada afirma que o sindicato estuda a forma como será realizado o processo judicial contra a empresa, se de forma individual para cada trabalhador ou em grupos de dez. “Vamos pedir para que o contrato [dos trabalhadores] seja reativado e que a dispensa seja anulada”, descreve.
     Os trabalhadores buscam reverter suas demissões. Uma comissão, formada por representantes do Sindicato dos Químicos Unificados e duas ex-funcionárias, esteve em Brasília (DF), no dia 15 de dezembro, e entregou um dossiê de denúncias contra a empresa a parlamentares e representantes do Ministério do Trabalho. Como resultado, a comissão obteve a garantia de que as denúncias serão investigadas.
     Os representantes dos trabalhadores também estiveram reunidos com o assessor da senadora e ex-ministra do Meio Ambiente, Marina Silva (PV/AC). Nas últimas eleições, Marina Silva concorreu à Presidência da República tendo como seu vice Guilherme Leal, um dos principais acionistas da Natura. O objetivo do contato com a senadora é tentar fazer chegar a Guilherme Leal, através dela, a situação dos trabalhadores demitidos.

     Matéria extraída do jornal Brasil de Fato, edição nº 408, de 23 a 29 de dezembro de